Exercício moral

Há muito não escrevo mas nem de longe pensei em abandonar a prática de bloguear – nem de inventar palavras.

Estou fazendo filosofia há alguns meses, mas recentemente resolvi seguir a sério, com dedicação e disciplina – Três coisas que praticamente inexistem na minha personalidade e por isso tenho me esforçado múltiplas vezes mais para conseguir qualquer sucesso. Um dos exercícios propostos pelo meu professor, e sem prazo de entrega, é o de mudar o automatismo da reclamação, substituindo-o pelo automatismo da reza. É um exercício que ajuda a ter controle do que você está produzindo interiormente, primeiro porque isto se torna perceptível e depois porque a idéia é enfraquecer e eliminar um determinado tipo de fluxo colocando outro no lugar. Já que estendi o exercício para o meu outro forte, o pessimismo agudo, no início do experimento achava que até iria descobrir qualquer vocação religiosa tanto eu rezava. Mas graças a Deus isso não ocorreu e continuo com os planos carnais, embora não pecaminosos – antes que alguém entre no automatismo do significado dessa palavra.

É praticamente assim:

“Odeio o meu trabPAI NOSSO QUE ESTAIS NOS CÉUS SANTIFICADO..”

“Sou uma fracasPAI NOSSO QUE ESTAIS NOS CÉUS..”

“Não vou consegPAI NOSSO QUE ESTAIS NOS CÉUS..”

“Nada dá certPAI NOSSO QUE ESTAIS NOS CÉUS..”

“Tomara que esse lugar exploPAI NOSSO QUE ESTAIS NOS CÉUS..”

“Que cara burro, puta que PAI NOSSA QUE ESTAIS NOS CÉUS..”

“Vou desistir de tudo e virar funcionária pública para agradar minha família e ser bem vista por toPAI NOSSO QUE ESTAIS NOS CÉUS SANTIFICADO SEJA O VOSSO NOME VENHA A NÓS O VOSSO REINO SEJA FEITA A VOSSA VONTADE ASSIM NA TERRA COMO NO CÉU O PÃO NOSSO DE CADA DIA NOS DAI HOJE PERDOAI AS NOSSAS OFENSAS ASSIM COMO NÓS PERDOAMOS QUEM NOS TEM OFENDIDO NÃO NOS DEIXE CAIR EM TENTAÇÃO MAS LIVRA-NOS DO MAL AMÉM.”

Funciona! Você realmente esquece daquele pensamento ruim e no final da oração ele não volta mais. Aquele não. Às vezes vem outro, pior e mais triste, mas aquele não volta! Quando oro vezes seguidas me acho um pouco maníaca, tipo um personagem de Almodóvar, e começo a rir. O que é ótimo, pois se o o estado de aflição não morre pela fé, morre pelo ridículo.

Pois os pensamentos ruins são rápidos e acendem na mesma velocidade que se apagam, mas quando você se propõe a estar atenta a eles, a capturá-los e substituí-los, você percebe a freqüência absurda com que aparecem: o tempo todo. O ridículo está nisso, em como esse modus vivendi é despercebido e presente. Isso faz pensar na quantidade de automatismos degradantes que nos acompanham e que não percebemos, de origem interna e externa, que inexistem na nossa visão e talvez  a maioria nunca consigamos enxergar.

A verdade é que ninguém se conhece. Embora exista uma divisão sobre este grupo: há os que não se conhecem, mas não sabem que não se conhecem; e há os que não se conhecem, mas sabem que não se conhecem! Ao menos eu já estou na segunda categoria.

Só sei que nada sei, e o fato de saber isso, me coloca em vantagem sobre aqueles que acham que sabem alguma coisa.” Sócrates

Ou talvez esteja na primeira. Não sei.